terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

RELATO DE GESTAÇÃO E NASCIMENTO DE ESTELA


Nas vésperas da virada do ano em que nasceu e prestes a completar um ano de vida, escrevo este relato do nascimento da Estela. Não há um só dia ou, mais ainda, noite no travesseiro, que não pense no caminho que percorremos e em como colocá-lo em palavras.  Talvez ainda esteja elaborando; talvez não o tenha digerido por completo, o que me atrasa neste registro. Cada detalhe, cada mudança, cada período do ano me faz recordar como foi a chegada de minha segunda filha. Tanto nas nossas vidas de forma intrauterina e espiritual como da chegada física ao mundo - ou seja, seu nascimento, em 27/01/2014.

(*às mais sensíveis e otimistas, este relato contém fortes emoções, cenas e demonstrações de frustração, ressentimento e fatos reais da ‘real life’)

A intensidade de Estela se dava desde muito, muito embrião. Comecei a sentir mexer muito precocemente, sem falar que às 16 semanas já tinha leves contrações de Braxton Hicks (contrações indolores, de treinamento). Ela sempre, sempre se fez presente, ativa, danada (hoje vejo o quanto!). Era o que mais me segurava e me recobrava a tranquilidade numa gestação complicada, de risco. E em alguns momentos, digamos até, de desespero.  Era isso: sua atividade, sua parceria e, porque não, sua vitalidade, alí dentro de mim.

Para se entender um pouco mais a nossa história é essencial retomar ao nascimento de Valentina (notem bem, em momento algum utilizei ainda a palavra Parto). De uma gestação tranquilíssima, longa, saudável, Valentina surgiu de bumbum para baixo (pélvica) e assim ficou. Decidimos aguardar a vinda e quem sabe a virada da nossa filha de forma natural.  Após muita luta, exercícios, Versão Cefálica Externa e acupuntura, ela não virou e  somente decidiu vir às 41 +3 dias, culminando em uma cesárea ‘consciente’ e muito dialogada entre eu e o Rodrigo. Leia aqui o relato:  Nascimento de Valentina

Sim, naquela época eu já tinha algum esclarecimento sobre a péssima situação da obstetrícia brasileira, sobretudo privada. Sim, eu já era ‘ ativista’ e queria parir. Queria trazer minha filha ao mundo da forma mais ‘normal’, fisiológica e natural que existe, no sentido de natureza mesmo! Mas naquele momento simplesmente não estava preparada para um parto pélvico e não aconteceu dela virar. Portanto, o (não) parto de Nina foi, de certa forma, mais digerido, aceito, elaborado.

DA GESTAÇÂO

Voltando a Estela, de grandes emoções. Quem acompanhou, sabe. Foi uma gravidez permeada de medos. Mas de muita esperança também. Tivemos o que chamam de placenta baixa total, ou placenta prévia, quando ela se mantém baixa até o final da gravidez. Saiba mais: Placenta Baixa central



Um primeiro sangramento na 13ª semana, um segundo na 17ª, a constatação da placenta baixa, e, daí por diante, sangramento quase que diário. Na sequência repouso, repouso, choro, leituras – umas boas , outras desnecessárias - muita dúvida, tensão, inconstância, solidão. Se a gente carrega, ou nos fazem carregar, a temorosa ideia de que ‘gestante nunca deve sangrar’, imagina você deitada, de cama, sangrando todos os dias??! Só digo isso: é barra!! Das grandes... E assim fomos levando, mentalizando, aguardando e torcendo pela subida da placenta. Que ela migrasse e se posicionasse num lugar seguro, fora do colo do útero.

23 semanas - levantada para tirar foto

A esta altura já estava com uma equipe espetacular, contando com uma das melhores obstetras do Recife e dentro do mundo da humanização; além de sempre, sempre participar dos grupos Ishtar, Boa Hora e Maternas –SP (desde a gravidez de Nina). As médicas sempre me mantiveram muito calma, me atendiam com segurança e tranquilidade, me davam esperanças. Uma me dizia que em 90% dos casos a placenta migra e outra comentava que “talvez seja melhor que vc esteja sangrando, pois isso também pode ser um sinal de placenta ‘ em movimento’”, pois às vezes ela pode ficar acreta (grudada na parede do útero)”

Às 27 semanas , quando o sofrimento , o repouso e a tensão já duravam cerca de dois meses e meio, e por acaso meu sangramento diminuíra, levei um susto enorme de manhã. Depois de um espirro forte, ainda deitada, senti algo muito volumoso sair entre as pernas...meu coração disparou. Fui rápido pro banheiro e liberei um coágulo imenso. E muito sangue! Fiquei desesperada, mas não era sangue contínuo, escorrendo em ‘torneirinha’. Liguei logo pras médicas e fui correndo pra emergência. Lá tive outra surpresa, dessa vez boa; além de escutar e a confirmação que estava tudo certinho com minha bebéia, voilá, escutei do ultrassonografista que minha placenta não encobria mais o útero! NÃO seria mais placenta prévia! Fiquei tonta de tanta emoção pra um dia só! E o coágulo, nada de explicações.. apenas saiu e se foi...achamos que era devido ao repouso, se formou uma espécie de tampão. Mas deveria continuar o repouso e foi indicado o corticóide para amadurecimento dos pulmões da bebê.



As semanas seguintes, para alívio geral da nação, foram de mais tranquilidade e menos, bem menos sangramentos. Minhas médicas falavam para eu começar a espairecer e sair de leve. Eu ainda muito angustiada, desconfiada, com o velho medo de ter novas surpresas. Mas dei umas saidinhas aqui e acolá. Até que com 30 semanas fui fazer nova USg e a expectativa era imensa! Enfim, escutei da boca da médica, que já me conhecia e sabia da minha luta, o que tanto sonhava: “sua placenta SUBIU! Tudo certo para seu parto natural e agora vida normal”! E mais: “CEFÁLICA!!” (música para os ouvidos, depois do caso Valentina). Fiquei tão emocionada que ao sair da clínica, liguei pro Rodrigo e chorei. Era uma página virada, uma grande montanha escalada. Estava bem, nova e estávamos saudáveis!

28 semanas- enfim, saindo pra jantar

30 semanas - Tchau repouso! Curtição

O SONHO DO VBAC

Daí pra frente comecei a vislumbrar o parto que tanto queria. Finamente a combinar em ter uma doula; escolhi uma pessoa  que teve o mesmíssimo problema que eu, de placenta baixa,  e, por isso, ela já vinha acompanhando minha história, meu sofrimento e me dando muito apoio. Depois, comecei a fechar plano de parto, hospital, piscina (logo duas! Uma pra casa e outra pro hospital! Pra não atrapalhar o sonho de parir na água), setlist de músicas...enfim, todos os trâmites para deixar tudo acertadinho e lindo para esperar o dia D. Ou o dia P (de parto). Sonhava sorrindo com meu VBAC (Varginal Bith After Cesarean). Estava tranquila, confiante e muito feliz de agora ter essa possibilidade. Fiz até um plano de parto, que foi muito bem recebido, sem ressalvas, pelas médicas.

Chegamos, enfim, às 38 semanas e comemorava “Uau! conseguimos! Quando eu pensava que talvez nem chegasse às 36!”. E nesta mesma noite, virando das 37 pras 38, tive um alarme. Acordei de madrugada, umas 4 da manhã, com cólicas, primeiro fraquinhas e depois aumentaram...Pareciam muito cólicas menstruais, que vinham e iam, e eu me revirando na cama. Fiquei com o coração palpitante e pensei: será trabalho de parto?? Nunca tive isso na Valentina.  Quase acordo o Rodrigo, mas resolvi esperar mais um pouco. Me contive, mudava de lado e tive paciência. Coloquei na cabeça que, mesmo que fosse o dia, deveria aguardar e não acordar ninguém e descansar. E assim foi. Acabei descansando mesmo e consegui voltar a dormir (umas 2 horas depois!). Quando acordei de vez, nada. Não sentia mais nenhuma cólica. Apenas uma certa dorzinha muscular no ventre , uma ressaca física, como se tivesse feito exercício.  É o que chamamos de alarme falso, ou pródromos! Meu corpo estava trabalhando...

A BOLSA!
Uma semana depois, exatamente de 38 para 39 semanas, começou mais um (outro?) grande desafio e provação na minha gravidez, parto e, quiçá, na vida. Na terça-feira, dia 21/01, não me lembro porque fui deitar com Nina na cama dela, bem cedinho de manhã. Na hora que coloquei o barrigão pra cima e estiquei as pernas, senti um molhadinho na calcinha. Antes disso tinha acabado de fazer xixi. Depois vi e não era nada demais, não era sangue, apenas úmido. Ao longo do dia, em alguns momentos, quando sentava ou deitava sentia molhar de novo. Comecei a desconfiar. No dia seguinte não tive dúvidas, senti um cheirinho característico e conclui que aquilo era mesmo líquido aminiótico! Estava perdendo líquido... minha bolsa devia ter rompido parcialmente. No dia seguinte, mandei mensagem para a médica explicando, mas sem dizer que estava desconfiada.  Ela que disse que era normal naquela idade gestacional, estar mais úmida, secreções, urina etc... Mas que, se eu quisesse, fosse no fim da tarde no consultório dela para examinar. Fiz isso e chegando lá ela já constatou sem dúvidas: era líquido e minha bolsa estava rota! Tudo muito leve , mas sim, eu estava vazando.. e intermitente. Na minha primeira gestação, minha bolsa rompeu por completo de madrugada, com aquela enxurrada clássica, e era somente o que eu conhecia.

Eu não estava assustada, nem com pressa, já tinha visto casos assim, de vazamento parcial e de mulheres que ficam um bom tempo sem entrar em trabalho de parto. Mas naquela tarde, alí no consultório, recebi uma espécie de “sugestão/ultimatum” que me pegou de surpresa. Minha médica só esperava 18 horas de bolsa rota para que fosse indicada a indução (medicamentosa), caso eu não entrasse em trabalho de parto (TP) naturalmente. Me desesperei. Em tese, eu já tinha mais de 24hrs! Mas ela não contou o dia anterior e começou a contar a partir desta quarta-feira, já dando uma tolerância. EU, que tinha aguardado tanto, até agora, 39 semanas, numa gestação difícil porque não esperaria mais?  Minha doula até cantou essa bola, lá atrás, quando fiz meu plano de parto, sobre bolsa rota e o quanto esperariam, caso não houvesse TP.  E eu simplesmente não parei para refletir sobre essa questão. O problema é que, caindo numa frase clichê: eu nunca pensei que isso iria acontecer comigo!  Mas uma coisa era certa e tinha isso mais do que confirmado na minha cabeça e plano: NÃO queria indução. Nunca quis indução. Muito menos agora que eu já tinha uma cesárea anterior (vide riscos de ruptura uterina, dores e contrações potencializadas e violentas e riscos de culminar em outra cesárea). Era o fim! Me sentia encurralada.

Alí na mesa, ela escreveu um pedido médico de internação pro dia seguinte, às 5h da manhã. Fiquei arrasada. Não queria simplesmente me direcionar ao hospital. Sem TP. Assim, de supetão. Enquanto escrevia tudo, ela afirmava “ah, mas por essas suas contrações, tenho quase certeza que você vai entrar em trabalho de parto esta noite”. Mas eram minhas velhas e boas companheiras de Braxton Hicks! Indolores, normais, que eu tinha o tempo todo. Não eram contrações de TP, oras! Voltei pra casa e a primeira coisa que fiz foi conversar com o Rodrigo que, informado e empoderado que é concordou comigo e nos mantivemos firmes. Na sequência, liguei para a outra médica (parceira e tutora desta) e disse em bom tom: “Não quero indução, não vou pro hospital, me ajuuudem!”. Ela  disse para aguardarmos a noite e ver o que acontecia.

Pedido de Internação - que eu não queria!


Dormi com a cabeça a mil, mas sentindo que não seria naquela noite que entraria em trabalho de parto e de como me sairia daquela situação. Às 6h da matina, a médica que pediu a internação me liga. Disse pra ela que estava igual, a mesma Leticia-Estela. Vazando, sem dor, sem TP. E fui sincera, porém atordoada, disse que não queria ir ao hospital, nem ia fazer a indução. Ela acatou e marcou uma reunião com a outra médica, todos juntos, nesta mesma tarde, para colocarmos todos os pingos nos “is” e resolver. Já era quinta à tarde, em torno de 54 hrs de bolsa rota. Desde então, cheguei a conversar com diversas outras pessoas, ex-grávidas que passaram por isso, doulas, parteiras, profissionais, daqui e de SP e quase todos eram unânimes: espere.

Sentamos os quatro (cinco! Rss) e debatemos muito. Elas alegavam que eu e a bebê podiam ter infecção e que a conduta delas era só esperar x horas, quando em gravidez a termo. Nós alegávamos que eu poderia também, na mesma proporção da infecção do bebê, ter uma ruptura uterina com a indução. Mas, a bem da verdade, tudo isso era pouco provável, ambas as situações.  Além de, em alguns casos, para a infecção, poderia ser feita uma profilaxia com antibióticos. E, o mais importante de tudo, eu acreditava no meu corpo, que uma hora iria entrar em trabalho de parto naturalmente.

Ficou acordado, então, que elas esperariam até sábado de manhã. Enquanto isso, elas nos sugeriram para eu tentar várias formas de indução natural. E mandaram fazer uma USg e exames de sangue para avaliar quantidade de liquido e infecção. Fiquei super satisfeita e esperançosa com a decisão. Mas, ainda assim, me encontrava numa situação super delicada, que requer muita coragem, muita determinação e, o pior de tudo, sem contar com a família e alguns amigos, que, para evitarmos especulações ou opiniões, não estavam sabendo de nada. Estava puxado emocionalmente.

Nesta mesma quinta (23), chamei uma doula-acupunturista em casa, ela foi super solícita, abraçou nossa situação e fez o que pôde para ativar meu trabalho de parto. Muitas furadas a noite toda, em todo o corpo, massagens. Chegou inclusive a dormir em casa, tanto era minha urgência e para mantermos os horários da acupuntura. Na manhã seguinte, nada. A mesma Leticia-Estela. J  Eu já tinha exames marcados, fui fazê-los e deram tudo certo. O próprio ultrassonografista indicado pelas médicas ligou para elas e disse “Tá tudo ok, tem liquido suficiente aqui”.  Idem, para o de sangue, nem traço de infecção. Ufa! Mais estímulos para eu aguardar meu TP e sua vinda naturalmente. À tarde saí para caminhar pelo bairro. E pensar, pensar, pensar... Só teríamos mais uma noite.

TRANSTORNO E SOLIDÃO

É chegado o dia limite. Sábado de manhã, nada de trabalho de parto, de contrações, de tampão. Nada. Eu estava fraca emocionalmente, abalada. Continuava perdendo líquido aos poucos. Marcamos uma conversa, as duas médicas, eu e o Rodrigo. Elas combinaram numa salinha do hospital e eu já meio desconfiada. Conversamos muito e, resumindo tudo, elas disseram que não nos acompanhariam mais. (meu mundo caiu!). Disseram que haviam chegado ao limite delas de tolerância (ou seria limite da Academia e de protocolos?). Eu falei que da mesma forma não tinha chegado ainda ao meu limite: o de aguardar; o de entrar em TP naturalmente. Que estava disposta e bancar aquela história.

Confesso que fiquei meio chocada. Achei que elas esperariam mais um pouco, nem que fosse mais 24 hrs. Mas foram decisivas. Alí se acabava a nossa parceria. Até me fizeram assinar um termo de responsabilidade dizendo que nós e outra equipe assumiriam daí em diante. Foi um papo tranquilo, sem rancores, com muitos argumentos de ambas as partes.  Mas ao começar a me despedir delas (uma me disse ‘quem sabe não vou aprender também com essa sua história?’), caí na real e me dei conta: estava praticamente SOZINHA, sem equipe, em plenas 39 semanas e 4 dias, com a bolsa rota!!  Meu Deus, que baque. Que desespero. Abracei o Rodrigo (meu único e maior pilar!) e chorei, chorei, chorei, como se não houvesse amanhã.

Fomos pra casa e a primeira coisa a fazer foi ligar pra uma Enfermeira Obstétrica(EO)/parteira querida, iluminada, que eu já conhecia e com quem tinha conversado lá no comecinho da gestação. Mas ela só realiza parto domiciliar e diante daquela gestação, eu tinha optado por um hospitalar (apesar de a cabeça ter uma  pontinha de dúvida e vontade de ter em casa). Liguei , contei tudo que acontecera, pedi ajuda, chorei mais um tanto. Eu chorava um pouco, parava, depois chorava mais. Me recompunha, caía na real e chorava mais um pouquinho.  Fomos até ela conversar. Entretanto, tínhamos poucas opções. O médico indicado pelas outras médicas e pela parteira - que tem feito uma trabalho incrível aqui em Recife de partos humanizados e naturais - e quem talvez me esperaria com a bolsa rota estava assoberbado de tantas gestantes e partos naquela mesma época e, portanto, não queria mais pegar ninguém. Ela, a parteira, também tinha uma ressalva: iria viajar dalí a três dias para a terra natal e ia demorar a voltar. Conversando pela net, uma parteira e uma médica de São Paulo chegaram até a propor que eu pegasse um vôo e fosse pra lá ter com elas!! Rsss..Imagina naquela situação?!   

Meu desespero e sensação de abandono apenas aumentavam.

Minha doula sugeriu que fôssemos naquela mesma noitinha comer uma pizza lá em Aldeia, onde estariam ela, esta parteira amiga e outra doula experiente, com maridos e filhos. Topamos e fomos com Nina. Foi naquela noite, naquela mesa de bar, num papel minúsculo, depois de muita conversa, muita matemática, muitas estratégias e argumentos, que traçamos algumas estratégias de parto, um plano A, um B, um C. Nossa primeira opção seria tentar ter em casa com essa parteira, se eu entrasse em Trabalho de parto até ela viajar (terça). Plano 2: se a parteira viajasse, procuraríamos aquele médico de novo pessoalmente e insistiríamos (enquanto isso, a própria, amiga também dele, tentaria convencê-lo a assumir meu caso); em terceiro, se ele não topasse, tentaríamos uma outra médica conhecida ou o IMIP.  E, assim, passamos uma noite super agradável, muito bem acolhidos, com risos e choros e muita vibração boa. Um ‘detalhe’: nesta noite meu liquido estava vazando muito, em bem maior quantidade que nos dias anteriores.

Plano de "Bar"


Materiais para o Parto Domiciliar


O DIA D, a esperada Hora P 

Domingo matina, 26/01, 5 dias de bolsa rota, cerca de 120 horas. Acordamos tarde e o Rodrigo logo se empolgou e disse: “vamos caminhar por aí, vamos ativar esse negócio!”. Ele também estava animado com a ideia de ter em casa e com a parteira/EO. Antes de sair, já pronta, deitei na cama e senti a ‘barriga’ muito quietinha. Mexendo pouco. E fiquei um tanto apreensiva.

Fomos andar. Colocamos Nina apertadinha num carrinho guarda-chuva e saímos pelo bairro. Enquanto isso, eu comecei a conversar com a parteira/EO pelo Whatsapp. Ela estava na casa do médico almoçando e  tentando convencê-lo de pegar meu caso. Uns fofos! Ambos disseram que, como iria completar 48 hrs dos últimos exames, era importante que eu fosse refazer pelo menos o de sangue (para avaliar infecção) no hospital que eles trabalhavam. A Usg faríamos na segunda. Tivemos que voltar pra casa pegar o carro e ir ao hospital. Fiz o exame que saiu na hora e estava ok. E lá mesmo pedi para ser auscultada, porque a estava achando a bebéia quieta. Mas começaram a demorar e, nesse tempo, senti um chutinho da Estela. Como não tínhamos almoçado, decidimos ir embora e falei com EO que , por sua vez, disse que passaria lá em casa para avaliar e auscultar.

Chegando na lanchonete, já mais de 16h, fui ao banheiro fazer xixi. E tomei um grande susto. Quando fui limpar, veio mecônio junto!! Outro baque! Meio verdinho. Sai com pressa, me tremendo toda e  chamei o Rodrigo. Liguei pra parteira desesperada e com medo. Ela me tranquilizou, falou para me acalmar e que estava indo lá pra casa. Eu estava bastante nervosa. Afinal, também não havia escutado ainda minha bebê, como eu queria. Por sorte, estávamos todos próximos de casa. A parteira chegou e a primeira coisa que fez foi auscultar. Ouvimos aqueles ‘cavalinhos’ galopando e ela brincando cantou pra mim ao ritmo do coraçãozinho “Estou bem, estou bem, estou bem”. Fomos confortadas.

O Rodrigo foi cozinhar, enfim, a almojanta e ela decidiu ficar por aqui e escutar Estela de tempos em tempos.  Na hora que começamos a comer, já umas oito e pouca da noite, comecei a sentir umas leves cólicas. E sorri pra eles: “Gente , acho que finalmente agora vai!”. Estava esperançosa e muito feliz em estar entrando no tão esperado trabalho de parto. E com ela, sem passar por toda aquela incerteza e mais espera.

Liguei para minha irmã vir buscar Valentina e começamos a nos preparar. Num determinado momento, estávamos sós, eu e a EO no quarto, e ela me pediu para auscultar quando eu sentisse uma contração. Ela testou umas três vezes e constatou algo que me entristeceu: os batimentos de Estela estavam caindo e não voltavam na frequência que deveriam voltar. Teríamos que ir ao hospital. Sem pressa, sem muita preocupação, mas ela, cautelosa e profissional que é, preferia estar lá e junto ao médico que estávamos falando. Minha doula por acaso também estava no hospital, pois havia atendido um outro parto antes. Fiquei triste em ter que ir. Já era uma coisinha que estava saindo do script (mas qual deles mesmo?? Depois de tantos scripts!).

Minha irmã chegou para buscar Nina, fomos práticos e monossilábicos.. (pois ela ainda não sabia de toda a história) e fizemos com que eles fossem embora logo. Juntei todas as tralhas. Malas, piscina etc e voltamos para aquele mesmo bat-hospital que fomos à tarde fazer os exames. Já era umas onze da noite. Que dia! E que noite! Quanta ‘aventura’!

A NOTÍCIA

Cheguei ao hospital já com umas dorezinhas embaladas, mas bem suportáveis. O médico me disse que eu deveria passar por uma avaliação com toque e ausculta. Numa pequena salinha, com ele e a esposa – que também é enfermeira obstétrica-, Rodrigo, a parteira e a doula presentes, ele me fez um toque dolorido, de onde saiu parte do tampão mucoso. Depois de uns segundos, com cara meio séria, disse um penoso: “Você não está nem com 2 cm de dilatação”. Fiquei arrasada. Auscultou e disse para eu me trocar e irmos conversar noutra salinha. 

Todos reunidos. Um silêncio. Ele começou a fazer um certo discurso e as únicas palavras que me lembro foram: “Os batimentos da sua filha estão caindo muito e você está apenas no comecinho do trabalho de parto. Se ela não está suportando agora com pequenas contrações, imagina num expulsivo, não aguentaria. Temos que fazer a cesárea”. E emendou: “Sua luta é a mesma da minha. Eu poderia dar esta notícia para outra pessoa, mas não queria ter que dar para VOCÊ”. Eu só escutava com a mão na boca e afirmando com a cabeça. Até que ele silenciou de novo e eu abaixei totalmente a cabeça e desmoronei caindo em soluços de choro, inconsolada (parecido com o sentimento de quando as médicas resolveram se afastar). Me perguntava soluçando e balbuciando: “poxa, eu passei por todo este perrengue da placenta, do repouso, do tempo de bolsa rota, poxa, poxa...vocês sabem o quanto sofri e lutei pra chegar aqui”. Foram minutos de desabafo e tentando me recompor. Não conseguia acreditar que alí se acabava meu sonho de parir.  Mais uma cesárea. Outra cicatriz no corpo e na alma.

Decidimos, então, que iriamos para outro hospital que aceitava meu plano, levando aquela equipe: o médico e a EO esposa, sua anestesista e a pediatra, mas, infelizmente, me despedia da parteira e da doula.

Nos deslocamos novamente e as minhas contrações já estavam fortinhas e doloridas. Quando cheguei no outro hospital, me encurvava no balcão da recepção com as dores. Liguei para minha mãe e avisei que ela iria nascer em breve, de cesárea. Já era madrugada, uma e pouca da segunda, hospital tranquilo. Enquanto eles preparavam a sala e esperávamos, sentia as contrações irem e virem. E vendo meu trabalho de parto progredindo, o médico ainda foi super  leal e cúmplice e perguntou se eu queria dar mais uma avaliada. Mais uma tentativa, quem sabe?!. E assim a auscultou primeiro. Porém,de acordo com  Rodrigo, sua cara não foi das melhores. Infelizmente, os batimentos cardíacos dela mantinham-se muito baixos. E, por isso, nem toque ele faria mais. “Não vou nem testar”, disse o médico. Partimos, assim, para a mesa de cirurgia. Curioso é que minhas contrações estavam doendo tanto que cheguei a desejar a anestesia que viria a seguir. Não foi uma cirurgia fácil. Demorou, senti cortando, falei muito e a danada da placenta deu trabalho, além de ter saído, na concepção deles, um tanto esquisita, aberta, cheia de ‘recortes’.


A esquisitona - talvez ela não estivesse mais dando conta direito

Nossa gordinha nasceu magrinha, às 2:50, da segunda-feira, 27/01/2014, com os olhinhos bem abertos e puxadinhos e um choro alto que lhe é peculiar. Pesou 2,810 Kg e mediu 48 cm.  Graças a Deus, saúdável, Apgar 9/10. E nasceu exatamente 1 dia antes da DPP, com 39 semanas e 6 dias. Seis longos, polêmicos e aguardados dias... Mas ganhei um presente lindo, incomparável, inesquecível, delicioso. Minha bebéia, minha ‘ finalidade’ disso tudo, meu serzinho intenso e único.

Minha realização - meu pacotinho em mãos (e peitos!)



Não gostaria de entrar no mérito de quanto sofri de dores e a sensação de atropelada por um caminhão no mesmo dia da cirurgia. E de quanto achei o corte grande, dos gases, das cólicas. Tudo isso, sem dúvida, fomentado pelo meu psicológico, pela frustração. O corpo cortado carregando uma cabeça pesada; e a cabeça agindo no corpo ferido.  Mas a máxima cabe aqui: uma Cesárea necessária salva vidas e temos sorte de podermos lançar mão dela.  Alguns disseram que aguardar o TP foi a melhor decisão, porque diante do quadro e dos BCFs da Estela a indução poderia ser ainda mais perigosa.

Não à toa demorei um ano para elaborar este relato. Aos poucos - e cuidando da minha filha linda, convivendo e amando-a cada vez mais - vou andando e deixando no caminho, para trás, as migalhas da mágoa, do sentimento de injustiça e da autopiedade em relação ao desfecho do parto. Até que toda esta ‘poeira’ em torno vá se dissipando, desaparecendo e vou me limpando, tirando as arestas, sedimentando outras. Com certeza, daqui a mais um ano, ou dois, sabe-se lá quantos, estarei de pé, ereta como a alguém com altivez, e direi para mim mesma: não foi injustiça passar por tudo que passei, e sim uma grande CONQUISTA, nós VENCEMOS.


Palavras de mães do Grupo que participo
 
Meu Rei e a princesinha indo pra casa





3 comentários:

  1. Ufa! Xeu respirar! Lembro a primeira vez que me deparei com seu blog, também grávida, o quanto me tocou e o quanto torci em silêncio por você, mesmo sem conhecê - la. Lamento muito por toda dor e lágrimas, mas te admiro demais. Não sei se seria assim tão forte. Pera, ainda tem lágrima aqui. Rs. Um forte abraço.

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  2. Lelê... que lindo! Chorando aqui... Vocês são abençoados!

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  3. Esse seu relato filha certamente será o presente mais significativo que sua filha ganhará, emocionante!!!

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